Exposição o desenho como ferramenta: "Divera, ou o que resta da vida"

A mostra, que segue em cartaz até 8 de agosto

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O desenho como ferramenta:
Divera, ou o que resta da vida


A exposição "Divera, ou o que resta da vida" apresenta cerca de vinte desenhos produzidos por Luiz Martins entre 2019 e 2024, Embora não concebidos inicialmente como uma série, os trabalhos, ao longo dos anos, passaram a revelar entre si uma espécie de conversa silenciosa. Estão unidos por gestos recorrentes materiais orgânicos e superfícies que absorvem mais do que mostram.

Curada especialmente para o Espaço Cultural Minas Tênis Clube, a mostra convida à reflexão sobre a vitalidade do desenho contemporâneo por meio de aproximadamente vinte obras sobre papel.

Com inerência já realizada por Sete Lagoas (MG) e Vitória (ES), e agora chegando a Belo Horizonte, a exposição evidencia a força do desenho enquanto elemento autônomo e multiplicador de sentidos. Propõe pensar o desenho não como esboço preparatório, mas como linguagem - capaz de lidar com o tempo, com o gesto e com a memória.

As obras revelam um processo que atravessa o corpo e o pensamento. A série Ingá, por exemplo, é composta por formas circulares que pairam ou colapsam sobre a superfície. Esses círculos - e, por vezes, "quase formas" - são feitos com nanquim e outros materiais que carregam tensões entre presença e apagamento. Evocam algo anterior ao desenho: uma sensação, uma lembrança, um resíduo.

Outras séries, como Capivara, expandem essa pesquisa com o uso de tintas acrílicas, extratos naturais e intervenções que extrapolam o contorno do traço. As cores surgem em camadas sutis - ora terrosas, ora densamente azuis ou vermelhas - misturadas à água, ao tempo de secagem, à imprevisibilidade dos materiais. Nesses trabalhos, o desenho se aproxima da pintura, sem abandonar sua origem mais silenciosa e tátil.

Algumas obras, maiores, exigem o corpo inteiro. Não se desenha sentado, nem com pressa: é preciso escutar o que o papel está dizendo. Mesmo nos desenhos menores, há essa vibração - esse convite à atenção diferente.

O papel - sempre presente - não é neutro. Papel de algodão, jornal, superfícies que registram o peso, a gravidade, os escorridos. Cada gesto carrega uma escuta do mundo, como se desenhar fosse também uma forma de se manter atento.

Há cruzamentos, cortes, repetições. Um desenho feito sobre uma página de jornal forma uma cruz: gesto simples, mas carregado de camadas. Entre o gesto e o sentido, há sempre uma dobra. O que se vê não é apenas imagem - é intervalo.

"DIVERA, ou o que resta da vida" compreende o desenho como uma poderosa ferramenta de linguagem. Cada trabalho se apresenta como vestígio de algo vivido - e talvez ainda por viver. A mostra convida o público a testemunhar não apenas o que as imagens representam, mas o que elas operam: rastros da existência, ecos de gestos, ressonâncias do mundo que ganham forma por meio do papel, da tinta e do traço.

O que resta da vida, aqui, não é o que sobra. É o que permanece. De verdade.

Adriano Casanova